Realismo e Neo-Realismo

“[…] A diferença real que existe entre todo o realismo passado e o realismo de hoje – o realismo humanista – reside essencialmente no seu comportamento em face da realidade. O realismo passado tem os seus alicerces na contemplação, na recepção e como tal é essencialmente descritivo. A realidade é nos seus aspectos encarada tal qual é, a nota dominante é a sua cópia, a sua descrição. O realismo passado como descritivo é em face da realidade essencialmente passivo, passividade esta que é um produto da sua própria estrutura contemplativa. Limita-se à contemplação e como tal a sua arte é uma arte de contemplação. É sobre este ângulo que, por exemplo, a obra de Balzac deve ser observada.
O realismo humanista, em face da realidade, é essencialmente activo. É contemplação e acção. Toma contacto com a realidade e age dentro dessa realidade. É acção pela arte. O que interessa ao realismo humanista não é a natureza isolada. É a natureza do homem. O homem deixa de ser - uma onda no oceano do movimento eterno da materia - para ser um ser consciente em luta com a própria materia. Não vê o homem pelo prisma da natureza, passivamente. Vê a natureza pelo homem, activamente. Dá-se uma intervenção do artista na vida como artista. Em face da vida real alienada destrói, porque quer construir. O realismo humanista não repele a faceta contemplative estagnante do realismo passado, naturalista. Envolve-a e supera-a. Envolve-a, porque a considera necessária na sua própria formação como campo de actividade, como ambiente. Supera-a, porque constrói, porque edifica, porque quer pela sua acção contribuir para a realização do humanismo na vida real, fulcro de realização de todo o verdadeiro humanismo. […]”

Mário Roma - "Realismo humanista. Extratos de umas notas", in : O Diabo, 235, Lisboa, 1939, p.3

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